A Importância da Perícia Contábil
De acordo com levantamento realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), até o dia 30 de abril de 2023, havia, no Brasil, mais de 84,5 milhões de processos em trâmite, dos quais aproximadamente 9,9 milhões foram iniciados neste ano.
Apenas no estado de São Paulo, no que concerne às ações de conhecimento não criminal (ações de execução extrajudiciais não fiscais e execuções judiciais), são cerca de 9,4 milhões de demandas pendentes.
O processo é a ferramenta disponível à população e aos órgãos do Estado para provocar o Poder Judiciário, visando a resolução de conflitos por meio da tutela jurisdicional. Para que a parte interessada possa ter por resguardado o direito que almeja, o sistema jurídico brasileiro outorga a prerrogativa desta requerer a produção de provas, visando demonstrá-la essencial, o que serve para o convencimento do juiz a examinar a veracidade dos fatos apresentados e proferir o julgamento com base nas alegações e no direito aplicável.
O Código de Processo Civil prevê, a partir do artigo 369, cinco modalidades de provas: depoimento pessoal, prova testemunhal, prova documental, prova pericial e inspeção judicial, as quais possuem como objetivo influírem no entendimento do julgador, para que este possa decidir a respeito do mérito do processo, isto é, do direito requerido.
Dentre milhares de ações processuais existentes, encontram-se as de execução, que possuem uma prática especial de trâmite, uma vez que, em comparação com as demais, consideradas de rito comum, tendem a ser mais céleres, como a ação de execução de título extrajudicial, comumente verificada quando tratamos de dívidas de valores.
Os títulos executivos extrajudiciais estão previstos no rol do artigo 784 do Código de Processo Civil, sendo que o inciso XII versa sobre aqueles constituídos por disposição expressa da lei, caso das Cédulas de Créditos Bancárias, entendidas como tal, desde que observados os requisitos especificados na Lei 10.931/2004.
Em que pesem as ações de execução, em especial as de títulos executivos extrajudiciais, possuem procedimentos mais rápidos a fim de garantir o direito da parte credora, a instrução probatória, por vezes, se faz necessária.
Uma hipótese disso são as ações executórias que versam sobre contratos bancários, os quais, nos moldes do Código de Defesa do Consumidor, são considerados como acordos de adesão, que consistem em cláusulas preestabelecidas que não possibilitam, às partes, prévia discussão e modificação.
Com relação a estes, principalmente no que diz respeito aos acordos de financiamento e empréstimos bancários, a dilação da produção probatória faz-se indispensável, uma vez que o contratante, consumidor da operação, é hipossuficiente nos três pilares existentes: técnico, jurídico e econômico. Isso decorre da ausência de conhecimento da estruturação bancária e da impossibilidade de modificarem e discutirem, amplamente, as cláusulas contratuais. A hipossuficiência econômica, por sua vez, deriva da necessidade perante as instituições bancárias e financeiras para o desenvolvimento de serviços empresariais e atividades econômicas particulares.
Diante disso, a produção de prova pericial torna-se crucial para serem tutelados os interesses do consumidor em detrimento das abusividades e ilegalidades praticadas pelas instituições bancárias. Isso, pois, os contratos bancários são definidos por meio de operações financeiras, que podem envolver juros, correção monetária, dentre diversas outras taxas e índices de natureza contábil e de extrema complexidade.
Com relação à pactuação dos encargos financeiros, por se tratar de contratos de adesão, em muitos casos, ocorre a aplicação de taxas diversas das contratadas e das informadas por estes ao Banco Central do Brasil, o que majora indevidamente os valores. Algumas abusividades verificadas na prática são: (i) a exorbitância dos juros remuneratórios; (ii) a incidência de juros capitalizados, sem a devida contratação; (iii) a utilização dos juros atinente ao limite de cheque especial; e (iv) a inclusão de juros moratórios superiores ao legal.
Desta forma, é evidente que o consumidor médio, ou seja, aquele que não possui a formação adequada para a análise e compreensão de todas as cláusulas pactuadas, não consegue demonstrar ao juiz os eventuais abusos aos quais está sendo submetido, sendo imprescindível a dilação probatória. Nesse sentido, é de extrema necessidade a determinação de prova pericial, prevista no artigo 156 do Código de Processo Civil, na modalidade contábil, para a verificação dos termos contratuais e conferência dos cálculos realizados pelos bancos no ato da execução dos valores, permitindo ao juízo, ao não possuir capacidade técnica para tanto, o auxílio de profissional da área para a análise pormenorizada diante do desequilíbrio na relação contratual estabelecida.
Diante disso, evidencia-se a necessidade da análise dos contratos bancários por um especialista contábil, a fim de verificar os encargos financeiros aplicados à operação, para conferi-los de forma imparcial e trazer os resultados ao processo para a elucidação dos fatos controversos e o auxílio do convencimento do juiz. Somente dessa forma, com a instrução processual completa e eficaz, por meio da perícia contábil, é possível que o juiz esteja suficientemente amparado para analisar as execuções fundadas em títulos extrajudiciais bancários, a fim de julgar o mérito de maneira justa, seguindo os ditames legais, em consonância aos princípios do contraditório e ampla defesa, por possibilitar à parte mais frágil do processo a devida instrução probatória.
Fonte: https://www.jornalcontabil.com.br/